sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Diário

Depois do sol

Resta um broto de esperança.

Em meio aos escombros,

Há sinais de um lento despertar.

As leituras não saciam

A comida enjoa com seu aroma peculiar

A música embala, mas cessa.

As páginas em branco do diário

Solicitam palavras soltas, e frases

Na composição dos seus adereços.

A voz inquieta questiona-se:

De que serve tatuar-se em papel?

Compartilhar esse qualquer coisa

Capaz de emudecer os dias,

A tentativa insana de traduzir a angústia,

Mostra-se no devaneio escrito.

A trégua sondada pelo não-tempo

A ponte para o estado de entrega

Na infantil brincadeira das letras

Acalenta, enquanto a escuridão noturna

Desfaz-se na luz do luar.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Águas minhas

Contemplei as águas do lindo lago
Ele me mostrou parte de mim
Confusa, tentei entender.




Foi o meu vazio
O autor da aparência que sou.
Revestido de solidão,
Transfigurado num monstro pessoal.

A moldura de outrem que habita em mim
Sob a acolhida da natureza de múltiplas formas que
Guardou algo selvagem na minh’alma.

A dúvida dói!
Assusta o tatear no obscuro,
Degrau movediço para o crescimento.
A dúvida é criativa,
Alimenta a imaginação.
O vigor de seu fruto
Fortalece a convivência.


Colho minhas emoções
Corrompo as palavras
Misturo ternura
Nos gestos rudes
Dados a essa criatura de argila
Sempre fresca.

Apenas convicta da fome de viver.



Os raios solares incidiram nas águas do lago,
E não pude ver nada mais.

domingo, 8 de novembro de 2009

Uma visão

Ela andou perdida sem rumo por alguns dias,
Levando consigo as lembranças que lhe marcaram,
E por impulso como se pudesse rever as principais cenas,
Voltou-se para olhar atrás de si.
Aquele olhar ainda mergulhado no passado congelou consigo o tempo
– ou parte dele.
Era o recomeço.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Fração

Sinto a fome cega

Devoradora de vida


Regozijo no vibrar do corpo

Caminho obscuro da ausência

Parte do meu eu


Eu sorvo o agora por ser descrente

O meu deus cabe em meu interior

Um fundo poço desprovido de ansiedades


As raízes brotam

E logo são depuradas no ar

Pois não há solo


Os elos me assustam

A ninguém confiança

A alguns o respeito


Presença inacabada

Querer laçado na estreiteza

Da hipocrisia geral


Nada peço

Preciso seguir em frente.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Homem de ébano

A tua entrega arrebata minha presença,

Teu modo de alegria é cheio de mim,

Atraída pelo infinito piscar de teus olhos

Não consigo entender.


Homem de ébano

Rio que atravessa minha vida

E me sorri com inocência

Teu mistério me intriga.


Retraio-me diante de ti

Sob as vestes da deusa maia.

Minhas palavras deixam-te embevecido

Transformas-te ao meu lado,

E cismo no contínuo desacerto

Dos caprichos do amor,

Capaz de inundar o sonho e a vigília.


Eu perdida na existência,

Controversa no discurso,

Instável no romance,

Amada na quietude do teu consentimento.


Intriga-me a doçura masculina

Oferecida em gestos firmes,

O abandono de ti em meus braços

Solicita um desabafo de minha razão.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Poema 15



Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ,ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.

Como todas las cosas están llenas de mi alma,
emerges de las cosas llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.

Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza.
Déjame que me calle con el silencio tuyo.

Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.


Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.



Pablo Neruda
Vinte poemas de amor e uma canção desesperada

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Um sinal

A manhã fria desperta
Com uma brisa silenciosa.
É um êxtase ver o dia começar,
Nos pensamentos sem rédeas
Na tranqüilidade de quem contempla.
O silêncio que transita pelo burburinho
Que desperta em poucas horas.
A comunicação conflitante dos que tem pressa
E dizem sem pensar num desabafo.
No íntimo é o silêncio que diz com clareza,
A sua destreza em rabiscar seu intento não falha,
Suscita o desespero de quem espera ouvir ruído qualquer.
O silêncio impiedoso fala verdades cortantes
E emudece a voz atrevida do impulso.
É ele o é mensageiro do fim, na sala de espera.
Nunca ameno sempre enérgico.
O silêncio usurpa do olhar a esperança
Quando se materializa em desinteresse.
O silêncio choca quando revela o esquecimento,
E tortura quando é portador da recusa.
O silêncio é transparente em sua quietude.
Veste-se de paz na maturidade do amor,
E de carrasco com nervos rijos esconde o perdão.
É o silêncio quem nega o beijo de comunhão
E sela a angústia do desentendimento.
O silêncio é traiçoeiro, arquiteta suas metas sem compartilhá-las.
O silêncio perturbador fala alto, sem meias palavras.
É entendido por ser seguido por um nada devastador.
Quando a porta ninguém bate, nem o telefone toca,
Quando tudo emudece.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Paixão que queima


A leveza no trato
A fala singela
Torna sólido o efêmero.
O simples é algo difícil de entender
O óbvio se assemelha as armadilhas.
Não foi possível lapidar as regras
Dispensadas junto às armas
Quando eu só queria ser tua.
Como traduzir o que sinto,
Ou como tu me percebes?
Viver o inferno de minha paixão
Arder na ânsia dos teus braços
Era o meu jeito de tornar indizível tudo o mais
E afirmar a vida no meu corpo.
O caminho racional nem sempre traz prazer
O que é uma vida de obrigações?
A incerteza é uma boa opção
Tão pessoal quão maravilhoso é a ilusão.
O depois faz parte do amanhecer
A paixão solicita entrega sem pudor.
Antecipar os acontecimentos destrói
A química de estar apaixonada.
Quero apaixonar-me milhares de vezes,
E que cada uma seja singular
Por vezes oscilantes em sua maré
Ou intensas em tempestades.
Que venham e permita-me aproximar-me.



segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Um pedido


A imaginação faz uma longa viagem

De idas e voltas a lugar nenhum.

Consigo leva as idéias desconexas

Numa avalanche de palavras

Para esconder o grito preso.

A evolução das estranhas horas

Em dias comuns, tornou o ar pesado

Para o corpo que alerta as contradições,

Num misto de emoções

Dissolvidas no esquecimento.

Tempo, tempo, tempo

Varre o que restou para longe muito longe

Antes que a loucura se aposse deste ser.




quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Numa Tarde



Debrucei-me na varanda como quem espera,
A porta estava entreaberta como sinal do meu estado interior.
Pensei naquele idílio, vendo-o como necessário.
(a palavra necessário não é romântica, mas apropriada)
Haviam pipas de variadas cores no céu,
Dançava cada qual o seu ritmo,
Num encontro e desencontro
Uniam-se ou separavam-se a ermo.
Tanto quanto homens e mulheres, meninos e meninas,
Famílias, pessoas levadas pelo engano.
De sobressalto ergui o olhar a porta, mas, aceitei a ausência
Pensando:
Quando voltar chegue sorrateiro, com um gesto de carinho
Não me dê explicações, nem pergunte como passei os dias
Não me declare amor eterno ou fiel.
Quando voltar venha em silêncio, com olhar terno.
Una nossos corpos num segundo de paz,
Acolha-me em teu peito.
Duas pipas se entrelaçaram caindo sob os festejos das crianças,
Telhados distantes as receberam.
Sorri da ironia, retornei a minha sala.
Antes, porém fechei a porta para prosseguir meus afazeres.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Uma nova cor



A primavera retorna
Com o seu colorido e perfume típico.
Contrasta com os semblantes acinzentados
Tão entregues a própria dor,
Incapazes de ver a beleza existente na tristeza.
A bandeira da culpa tremula
Para saciar essa verdade sombria.
Pobre palavra vazia
Festejada na lama pelos doentes da alma.
Criaturas controversas
Discursam contra seus atos
Oscilam entre os pólos, descuidadas.
Ah! Como pode alguém temer o brilho
Da primavera?
A vida floresce, convida a viver.
Pode-se permitir mais, condenar-se menos.
Sentir-se leve, mostrar-se simples.
Não julgar as possibilidades,
Vivenciá-las do próprio jeito
E ser mais de ti.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Quando escrevo


Desabafo quando escrevo
O corpo tenso expressa emoções sufocadas.
Só o meu olhar mantém a alegria
Dos tempos atravessados.
Mostro-me quando escrevo,
Menos tímida
Mas, desconfiada das intenções alheias.
Perambulo como as folhas outonais
Ao desgarrar-se de suas árvores.
Encontro-me quando escrevo
Por dizer algo sobre o que me toca
Pela intimidade com a emoção do outro.
Escrevo para desvendar a minha sombra
Ou para não deixar de me expressar.

Eu e a Cidade


Os pássaros revoam
Enquanto o tráfego segue lento.
A cidade e os seus sons
Usurpa qualquer recusa
A sua turbulência.
                                                                                             
Fecho minhas janelas
E não permito que me digas o que fazer.
Teus conselhos vazios 
No meu interior não encontra eco.   


O humano assim o é por ser singular
Voltar-se para si é a melhor aventura.
Não que a solidão seja consoladora,
O mistério aí contido estimula a permanência.


A cidade é construída
Pelas mesmas mãos que a renega.
Como tudo o mais,
O interesse quer o que distante se mostra.
O que fazer com a presença do agora?

sábado, 19 de setembro de 2009

Depois da bonança



Esta noite não sonhei, na verdade nem dormi.
O silêncio persistente preso nas paredes gélidas
Não é acolhedor.
Os dias arrastam-se nutridos de tempestades interiores.
Olhei o vazio, para que minha mente criasse imagens livres.
Quiçá, abafar a saudade que arrebatou meu peito.
Sua voz calara-se,
Com as histórias da velha infância, com seus dissabores,
Com suas piadas mal contadas.
Poderia ser diferente? E como seria?
Não adiantaria perguntar,
A razão e as palavras nada valem quando nos entregamos
Ou perdemos um grande amor.
Quedei-me num canto onde me despi da farsa social,
Com a ferida a latejar unindo-se a outras cicatrizes.
Com pesar relembrei as últimas palavras:
Um adeus recíproco.
O adeus que selou a cumplicidade corpórea, que cessou a doação.
Por quê? Por que tentamos conduzir o destino?
Nem tudo foi dito, porém, de tudo ficou a certeza
Que as tuas águas turvas me fez velejar por belos horizontes,
E a tua inconstância alicerçou a minha serenidade.
Essas águas apenas me deixam sentir
Que és tu a fonte que em mim secou.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Pele Vermelha

As estrelas já se despediam
Dando lugar ao nascer do astro maior,
Quando a mulher de pele vermelha
Cansada da lida de suas relações
Com os chamados semelhantes
Andou na areia de frente ao mar.
Concentrada nas controvérsias dos mundos individuais
Caminhava distraída e atraída pela brisa.
Inebriou-se ao som do mar,
Exalando o seu cheiro natural.
A mulher de pele vermelha trazia semelhanças
Com as flores que se mostram.
As causas externas perturbadoras de sua breve paz
Ali se dissipavam.
Ela sabia corporificar
O elemento que a natureza lhe predestinou.
Era mulher de pele vermelha,
Ciente de seus limites
Amante da liberdade
Ser de múltiplos desejos.
Trazia sentimentos fortificados
No tempero dos sofrimentos.
A malemolência no corpo exausto, a tornava parte do cenário.
O toque suave dos raios aquecia sua pele,
Fazendo-a oscilar entre a imagem selvagem de outrora
E a delicadeza de quem tem nobreza de coração.

sábado, 12 de setembro de 2009

Um lado da margem

Parecia ser o último combate
Quando cansada ela sentou-se a margem.
Encantadora era a paisagem!
Ali aquietou o corpo e também o coração.
Há tempos se entregou as suas batalhas.
Na verdade, eram seus ideais.
Sim, ela os tinha!
(Como era possível ainda ter ideais? Não sei.)
Embora em seu íntimo a sua crença em dias de sossego
Tenha sucumbido numa antiga trincheira.
Em cada dia significava a si
Porque queria perpetuar a vida,
Além dos sonhos,
Mais até que a longevidade corporal.
No último combate, ela sabia que não venceria
Mas, experimentá-lo seria uma grande lição.
Guardar-se em nada acrescenta,
E ela construia a própria vida.



quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Mudança



Toda verdade é meia verdade
Pois a mudança é perene
O que parece destaque agora
Entrega-se ao esquecimento depois.

O que significa a sensação de ordem?
Organizo o meu mundo
Ou sou deslocada por ele?
Sentir a pureza do ato na experiência
Acumula sabedoria.

A delicadeza do ar desse bosque
Leva para longe um pouco de mim
Sem certezas para o retorno,
Nesse giro nada será como antes.
Não paro, a incerteza me atrai,
Quero um novo porto
Que me conte novas histórias.

Um coração aberto pode ir adiante,
A vibração da vida o guiará.
Sem elos permite que tudo seja
Como deve ser - Imprevisível!

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Nuvens que passam

Vi as nuvens moverem-se em despedida
Fui inundada por imensa paz interior
O peso da existência se desfez
Pude reinterpretar o mundo,
Sem a ilusão dos quereres.
Senti que eu era como ali estava,
E ambicionei
Não ser mais do que aquele corpo presente.
A compreensão de mim,
O abandono nas sensações despertadas
A paz de quem não exige e nem espera.
A potência de viver um sonho
Em tempo real.
Do encontro perfeito por ser natural,
Assim me senti: um eu capaz de se renovar.
Ah! Felicito-me por estar aqui agora
E sentir-me cheia de vida
Sem conclusões infinitas
Reflito quando sinto a razão do existir.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009


Lembrança

Fim de tarde
Toca nossa canção,
E me traz a juventude do que um dia foi paixão entre nós.
Teu cheiro, tuas mãos ansiosas por descobertas
E tua voz rouca que dizia: te quero.
As notas me embalam e sinto teu corpo tão quente como antes.
O som fica distante, o que restou de nós é varrido para o norte das lembranças.
E o teu semblante se desfaz para mim.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

A essência da rosa


Conheci a solidão
Em etapas turbulentas.
Ela surgia do meu lado de penumbra
Sob a luz do sol.
Jamais se despedia
Errante consumia a desordem interna
Indefinível como o vento.
Olhei-a de frente e compreendi
A incapacidade de adentrá-la.
A fatídica certeza de que ela
É parte disto que sou!
Não era abandono
Tampouco falta de amor.
Sou uma essência espinhosa
Composta também de solidão.
O que é a solidão?
De onde vem tudo o que arrasta?
Respostas vazias me deixaram
A espera na estação vazia
Que nada traria de palpável.
O que viria ao meu encontro?
Angústia ao pôr do sol
Expectativas ao acordar.
O espanto diante da vida,
E o morrer um pouco em cada dor.
A vida que se debatia em minhas mãos
Queria emergir e tocar o tempo
Alvo desse querer insano.
Ela era minha,
E para ela não havia lágrimas
Apenas o silêncio de quem permanece.

terça-feira, 4 de agosto de 2009


Fala à Lua

Eu optei por mim
Quando no deserto estava.
E foi a mim que afaguei
Com egoísmo.
Minha imagem na poça
Causou-me emoção.
Algumas pessoas,
Em lugares diversos
Chamaram a minha atenção,
Trouxeram-me gratas surpresas.
Comovida quis seguir
Descobrir, provar o sabor da liberdade!
Dores existiram,
Acredito que por todo caminhar elas surgirão.
Mas por mim, eu digo:
Guardarei as cicatrizes
Sem abandonar a jornada.
Por mim,
Eu sobrevivo dia a dia
Em ti,
Encontro amparo.
Compartilho o que posso, pois
Em mim está o meu tesouro.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Toque

Sinto o efêmero gosto
Da liberdade
No toque dos teus lábios.
A alegria contida
Deságua em teus braços
E ali floresço
Com gratidão para
A paz da vida.

quarta-feira, 22 de julho de 2009


Delírio

Sinto sufocar os sentidos
E a necessidade de dizer algo
Apodera-se de mim,
De correr para alguém,
De relatar minhas decepções e certezas.
Ah!
Como eu gostaria de ter um dia harmonioso
E de perene sentido diante de mim.
As águas me embalam
Com cheiro e lição
De ser a mesma em diversas fases.
Eu queria estrelas
Na escuridão da noite
E o azul que abraça a imensidão
Do céu palco do meu sol.
Eu queria ser minha
E deixar de lado a posse.
Eu queria olhar mais uma vez o orvalho
E ter o deleite do caminho das flores.
Queria doar um sorriso,
Deixar minhas pétalas como lembrança.
Não dá, não é para ser
Escrever é minha convulsão de pensamento
A caneta rabisca minhas dores
E entre cores libera a minha alegria.
Ah! Como queria, sem remorsos ou fantasias.

Nossa Canção

No rádio toca a nossa música
E em meu corpo sinto teu calor.
Encontro tuas mãos perdidas
Entre as minhas,
No afago em meus cabelos.
A tua presença
Espirituosa
Ainda hoje como no passado
Traz a candura
Dos dias de paz.
A melodia transcorre,
Leva-me até o repouso dos teus braços,
Com tua voz abafada.
Embalada em nosso ritmo
Descortino meu universo
E te encontro.
Na tensão do desejo,
No incendiar da pele tocada
A luz na alma,
Era o instante feliz!
Capaz de evaporar-se no piscar de olhos,
E ainda assim eterno.
No carinho da escuta quebrado
Por palavras simples
A canção termina,
E volto a minha rotina distraída.




Prado

Retornei ao meu prado
Para sentir-me gente.
O frenesi da metrópole
Dá-me angústia,
O pôr do sol
E as fases da lua
São incompreensíveis
Sob seus holofotes.
Não há tempo!
Os homens-máquinas
Multiplicam-se entre tarefas infindáveis
E de diversas ordens.
Tudo parece pesado
Esgotado de possibilidades
Aos indivíduos programados.
Sempre semelhantes!
Colecionadores de títulos
Escravos sociais
Bravos atores
Lustram seu cinismo
Chamado cordialidade.
E com frustração, culpa e cansaço
Como último suspiro,
Entregam-se a bandeira de seu time
Dividem-se entre igrejas e sindicatos
Tornam-se devoradores de livros
Especialistas de coisa nenhuma,
E debatem-se com o vazio
Beiram o desespero,
Esquecem de olhar-se, respeitar-se
E permitir-se ser diferente.
Para colher as flores do próprio caminho

E sentir o grande astro voltando-se para si.

quinta-feira, 16 de julho de 2009


Sepultura

Não posso imaginar como seria,
Se tuas palavras fossem proferidas
A mim.
Se soubesse das minhas alegrias.
Se estivesse comigo a cada tristeza talhada.
Se tua mão me tocasse para sufocar o medo.
Como seria?
Será esse o meu ponto de interrogação?
Houve lágrimas que secaram
Em um coração estéril
Com o amor em broto,
E esforços contagiados pelo passado.
Agora olho a travessia,
Não consigo lembrar o teu rosto
Você se esvai, sem regresso.
A amargura torna rijo o mover-se.
Depois do sonho vão,
Vou construir um dia de cada vez
Apreendendo os sinais.
As amarras se rompem aqui.
Um convite sutil me leva ao retorno
Não solitária, em companhia de mim.
Deixar o amor florescer
Sepultando o que nunca será.

terça-feira, 14 de julho de 2009


Crepúsculo

O fim da tarde trazia os últimos raios
Calando as vozes do dia.
Absorvida pela beleza da cena
Não percebia o calor da hora
Afagar a pele.
Eu apenas existia!
O crepúsculo tornava brando
A inquietação.
O gosto de fel e o feitiço da imagem
Trouxeram-me a pergunta:
Por quê?
A minha alma convertia-se
Em várias mulheres habitando o corpo frágil.
Os ruídos urbanos eram imperceptíveis.
As tantas formas de mulher poderiam ser percebidas?
As cores do firmamento mudavam
Ofertando sensações longe do cotidiano.
As trevas do meu pensar resistiriam por quanto tempo?
O insondável permeava a transmutação do dia
Despedindo-se com um derradeiro vento.
Senti-me tocada.
O que mais poderia querer após os tormentos
Da labuta diária?
Os reflexos exterminavam a obscuridade
Lembrando o breve recomeçar.
E o que de tudo isso permaneceria?
Era o findar de uma bela tarde.

Cavaleiro Branco

Um vasto campo florido convida a sonhar
Reaviva quereres de um guerreiro branco
Cansado, desacreditado por si, faminto de vida,
Despido de honra.
As cores florais reluzem na armadura
Que oculta as cicatrizes de sua alma,
E guarda a leveza daquele ser.
O perfume exalado distancia as batalhas perdidas
Esconde a covardia nos gestos.
Naquela vastidão o cavaleiro branco repousa,
Sonha com possibilidades outras.
Seu castelo de fantasia dissipado
Pelos horrores da sobrevivência
Impôs a mágoa, seu algoz.
O cavaleiro branco açoita seu destino
Desejoso do efêmero prazer
Do instante indizível da plenitude de viver.
O cavaleiro branco esconde seu encanto
E não se deixa amar.
Mostra seu sarcasmo.
Incrédulo, assim o chamam!
Desorientado de angústia desbrava mundos.

sexta-feira, 10 de julho de 2009


As dores

As dores do mundo
Fizeram-me parar,
Faltava compreender
O que isso seria.
As dores do mundo
Seria o medo, a fome
A perda, A doença,
A insegurança,
O que chamam de sofrimento?
As dores do mundo
É uma invenção
Uma voz que manipula
Os ávidos por heróis
Os pobres necessitados
De segurança, De família,
De santos, doutrinas,
Políticas.
Causa desconfiança!
As dores do mundo
Podem ser chamadas
De mundo,
E seu constante movimento.
Assusta,
Pois não se curva
É livre.
As dores do mundo
No mundo de dores
Precisa que sejamos capazes
De querer
De produzir
De viver
Com o prazer
De ser quem somos.

Gotas

Senti algo escapar-me
Por entre os dedos.
A chuva era sem trégua,
Dia cinza!
Eu nada possuía.
Pasma,
Eu nada queria possuir.
A torrente arrastava
As folhas.
O som da água
Aquietava meu ser.
Esse algo não escapava
Eu o mandei embora.
Nada podia ser meu,
As gotas de chuva
Pediam atenção.
Eu não podia.
E a chuva agora fina
Parecia despedir-se
Deixando-me em abandono.
Escassas gotas
Escorriam
Em meu corpo
E eu
Não sabia mendigar
Por seu afeto.

sábado, 4 de julho de 2009


Cinzas

A minha sombra
Perambula a ermo.
Meu inverno se dissipa
Entre passos irrefletidos,
O horizonte em nada mudou.
Percebo com espanto,
A ordem dos acontecimentos
Estática.
A minha solidão é povoada
De fantasmas
De esperanças.
Respiro o ar leve
Estranhamente.
Sinto
As ondulações,
Nada está como antes.
Estou fora do tempo
Mas ele resiste em mim,
Imperfeita
Completa,
Nas cinzas
Ao vento.

quinta-feira, 30 de abril de 2009


O espelho

O espelho reflete uma imagem embaçada
Um estranho?
Não pode ser, é ilusão do cansaço talvez.
Acontece quando se teima em ter confirmações
Da própria aparência.
Previamente aconselhada pela mídia
Mesmo que não se saiba por que ou para quê.
“Há especialistas para quase tudo que se imagina atualmente.”
Mas, não é a aparência o que choca nesse encontro.
O embate matinal é singular,
Pois o olho examina
E ilumina grandes falhas não preenchidas.
Sim, o olho inquire o mais fundo,
Algo desconcertante mostrar-se sem os retoques da maquiagem.
Como esconder-se de si?
Suportar o que és?
Tamanha exposição causa danos
Evidencia a solidão, o medo, o fracasso.
Atuar com o esmero teatral é o fim último de cada dia,
Todo entretenimento possível está presente nessa peça
Para evitar o fatídico encontro consigo.
Os shoppings, shows, cinemas, teatros, livros, internet
Corroboram para que o pão e o circo estejam sempre presentes
Na comoção da euforia capaz de afastar a imagem do espelho.
Com qual finalidade pensar nesse assunto tão escabroso?
Ele não traz fama tampouco dinheiro.
Quando não for mais possível suportar a imagem refletida
Quebra-se o espelho
E compra-se uma imagem que o defina apropriadamente.
Possa ser esse um víeis para tolerar o próprio silêncio,
Uma maneira de aplacar o chip de obediência.
Quem sabe até não és capaz de pensar sozinho?
Com alguns ajustes podem buscar esse tema num chat de bato papo
E não refletir sobre o assunto, mas recorrer a outras opiniões especializadas.

terça-feira, 28 de abril de 2009


Ser

O que é uma pessoa?
Quem pode afirmar
Se um ser biológico ou pensante?
Que se estraga, mas deixa semente.
Um sujeito um indivíduo
Que perambula no ilimitado.
Irrepleto ou completo
De dores, de amores
Dos que conduzem e
Dos que se deixam conduzir.
Poço borbulhante
De emoções, razão, sentimentos.
Que torna tateável a possibilidade
Individual imerso na multidão.
Entre a efervescência dos dias,
Dias iguais aos do passado
Semelhantes aos do futuro,
Dias fervilhantes do agora
Mutáveis sob o jugo
Profundo confuso do que anda.
Viajante faminto dos grãos de terra
Por nada serem a mais
Que segundos, do nascer ao pôr do sol.
Deleitosa criatura,
Misteriosa em passos firmes ou vacilantes
Para herdar o compasso da existência.

domingo, 12 de abril de 2009


Mania

Reclamar é uma cega mania
Realçada na procura por defeitos.
Ou seriam sutis imperfeições,
Capazes de incitar indagações perenes,
Fincadas na primitiva desconfiança
Das tribulações diárias?
Falar é elementar para espalhar o pólen dessa dúvida.
Escutar estórias a ermo, astúcia silenciosa,
Na descoberta de um possível semelhante.
Nesses dias estéreis sem pôr do sol
Sob a luz onde tudo se dá,
Com a batalha travada não há esclarecimentos.
Os peregrinos se perdem em oásis fictícios,
Na compaixão de si ou quem sabe do outro?
Visto como igual na insensatez,
Solto na pluralidade cumprindo sua trilha.
Deter-ser em algo seguro é paradoxal.
Protestos não constroem, pouco modifica,
Mas as reclamações, essas permanecem.

sexta-feira, 10 de abril de 2009


Felicidade

Mais um feriado. A alegria artificial se espalha pelas rodovias obstruídas por pessoas entediadas com a própria existência. Ávidas por um novo cenário para a encenação de suas vidas vazias. Vão ansiosas para afrouxar as amarras de suas máscaras. Camuflam o desespero e fingem felicidade. A felicidade pode ser instantânea. Pode vir em lata, em caixinha talvez seja melhor, pois o material é reciclável. E está na moda preocupar-se com o planeta.
Há procissões escondendo rancores, ritos religiosos repetidos em nome da tradição mecânica. A fé já não nos parece tão límpida e inodora, mas sufocada como única ponte de saída da ilha do sofrimento. Há cultos dionisíacos numa inversão de deuses, onde todos parecem felizes, sem jejum em ato de permissividade.
O comércio também explicita sua felicidade. Coroada com a compulsão do ter por ter, para mostrar, ostentar, seduzir. Continua a sugar até a última gota de razão de suas vítimas vendendo símbolos. Mesmo em tempo difícil, de crise econômica!
Reclamando e vendendo- vendendo e reclamando - um mantra silencioso.
A besta insaciável está de prontidão. A todos muitas especiarias da época, é preciso gastar a gratificação do seu árduo suor. Haverá ainda pedras para serem carregadas. Seu suor será mais uma vez gratificado. Benditas sejam essas pedras! As compras precisam continuar. Não é preciso pensar nos acontecimentos, não agora. A felicidade chegou, mas em breve partirá. Na segunda- feira tudo volta ao normal. Vidas acinzentadas retornam ao cotidiano, mergulham em desespero particular, até o próximo feriado.