sexta-feira, 10 de abril de 2009

Felicidade

Mais um feriado. A alegria artificial se espalha pelas rodovias obstruídas por pessoas entediadas com a própria existência. Ávidas por um novo cenário para a encenação de suas vidas vazias. Vão ansiosas para afrouxar as amarras de suas máscaras. Camuflam o desespero e fingem felicidade. A felicidade pode ser instantânea. Pode vir em lata, em caixinha talvez seja melhor, pois o material é reciclável. E está na moda preocupar-se com o planeta.
Há procissões escondendo rancores, ritos religiosos repetidos em nome da tradição mecânica. A fé já não nos parece tão límpida e inodora, mas sufocada como única ponte de saída da ilha do sofrimento. Há cultos dionisíacos numa inversão de deuses, onde todos parecem felizes, sem jejum em ato de permissividade.
O comércio também explicita sua felicidade. Coroada com a compulsão do ter por ter, para mostrar, ostentar, seduzir. Continua a sugar até a última gota de razão de suas vítimas vendendo símbolos. Mesmo em tempo difícil, de crise econômica!
Reclamando e vendendo- vendendo e reclamando - um mantra silencioso.
A besta insaciável está de prontidão. A todos muitas especiarias da época, é preciso gastar a gratificação do seu árduo suor. Haverá ainda pedras para serem carregadas. Seu suor será mais uma vez gratificado. Benditas sejam essas pedras! As compras precisam continuar. Não é preciso pensar nos acontecimentos, não agora. A felicidade chegou, mas em breve partirá. Na segunda- feira tudo volta ao normal. Vidas acinzentadas retornam ao cotidiano, mergulham em desespero particular, até o próximo feriado.

3 comentários:

Hilton disse...

A dor e a percepção da dor.
As portas precisam estar livres dos batentes e a gravidade cuotidiana das coisas pressiona para fora um
milhão de inquietos anseios.
Eu questiono meu sonhar
e as imagens que borbulham da cabeça
após um dia de trabalho & sangue.
O mêdo acossa o batalhão das taras
e a sede do prazer não é um impulso claro e nem sem contrações nervosas que esgotam nossa singularidade.
Mas eu, que me escrutino na perspectiva do atrito indispensavel para prosseguir
desperto daquelas confusas
alucinações e me pergunto...
Onde nos furtaremos ao golpe sangrento da ânsia
e do anêlo evidente de ser?

jorginho da hora disse...

Olha, perpcacia e lucides me impressionam. As pessoas vivem nessa ilusão louca do ter para ser. É aí que o lobo mau nos pega.

Carol Araujo disse...

Rosinha! Eu sou sua fã incondicional! Minha nossa!!! Quanta sinceridade e como é pessoal! Estou em êxtase (no sentido mais grosseiro da palavra) até agora! Estava lendo pra Tonha tb, várias outras inclusive. Palavras dela: "Amei, Carolzinha, essa aí. Tá aí!". (rsrsrs). Você é fera nisto Rosa, tenho muito orgulho.
Uma descrição perfeita da FUGA do nosso "eu" na pele de pensar ser uma PROCURA de um outro que talvez nem exista dentro ou fora de nós na realidade. E é uma pena que tantos dêem valor ao que é material e siga modas como se fossem suas vontades próprias.
Parabéns por esse dom, talento, inteligência, simplicidade, naturalidade, intimidade com as palavras e suas combinações. Sou muito orgulhosa em conhecê-la.
Obs. Não se ache (hahahaha) - você merece.