quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Culpa Apontada

A urbanidade dos dias molda a vizinhança.
Buzinas, pedestres cruzam o caminho sem saber do outro.
A vida tal qual o rio, transcorre quase ocultando as suas variações.
Por encanto ou astúcia, Ilude com a primeira imagem.
Entre quimeras e futilidades alguém se reconhece ou repudia
O espelho de outrem.
Na fração desse raio a vida presenteia ou dilacera
No olhar de confronto da caça e do caçador
Onde inexiste a humanidade da lei e a divindade da justiça não tem raiz.
A tensão de estar vivo é percebida no sorriso triunfante,
Remexido em desespero do coração sem eco,
Daquele que se diz reto revestido de inquietações.
São os outros que talham o culpado, a culpa não passa de mera palavra.
A estupidez difere da maldade, a lenha pode talvez virar brasa.
A indulgência duela com a severidade, mas nem por isso desfaz cicatrizes.
No final, do homem só restará cinzas.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Solitário Jean

A beleza do mundo perpassa todo canto
Onde há criaturas para ver.


E nem por isso todos são centelhas,
Há viajantes errantes na vida.


Uma daquelas almas massacradas
Pelo julgamento alheio cruzou o meu caminho.


Alguém de brilho próprio,
Na bagagem simbólica trazia trevas e luz,
Um algoz feito em vítima,
Solitário sem nome.


Esqueceu seu passado lapidando o presente
Desprovido de sentimentos
Enterrou-os em seu âmago.


Inquisidor por natureza,
Robusto para sobrevivência,
Dedicou-se a perscrutar o outro
Achando-o sempre vazio.


Talhou seu mundo com a sua verdade
Pois encontrara apenas hipocrisia.


Leis da Vida

Sair
Sem apego ao que fica.
Caminhar sem chegar
Sentir-se em paz na própria companhia.
Buscar os olhos alheios sem misericórdia.
Ler livros sadios
Ter fé fora do templo
Deliciar-se com o aroma das flores
Confiar na firmeza dos passos
Ter ânimo constante
Indicações não peremptórias
Quando,
O trabalho mortifica
A leitura é cansativa na balburdia da vizinhança
A fé limita-se a vida real
O além do nada surge e para o nada se direciona.
O cheiro natural é único
Construir-se é a missão.
A lama que arrasta
É também pulsão.

Descrição Impossível

Amo o indescritível de doçura escondida,
Atrás do muro de cinismo.
Seu sorriso distraído é belo, sua língua ferina.
Amo-o, mas não declaro
Somos sobreviventes de tragédias íntimas
Amo-o, fora das horas ordinárias
Sem pontes possíveis.
Amo-o, de pé no meu porto seguro
Distante do toque.
Amo-o, sem ser sua
Com desobediência
Com devoção.
Amo o incompreensível que forja caminhos,
Cego como narciso, impetuoso homem.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Jamais por Inteiro

Alguém disse: por inteiro te quero

Lábios de pecado entre sorriso

Responde: só assim é possível.

Ser metade é piedade, é punição de si.

A fala incompleta deixa rastros sutis,

Envolvidos no misterioso andar de dama

De guerreira, de vadia.

Essa presença sombria

De amor, perdição, deleite

Ou não mais que

Engano da guerra interior.

É contraste ser inteira,

Sou múltipla sou mulher.

Por generosidade compartilho o veneno

Exponho as cicatrizes.

O queres de mim

Se inteira para outro nunca fui?